Quarentena no Chile, dia 11

Desde criança, sempre morei em casa. Nunca tinha morado em apartamento, até me mudar para Brasília, já adulta. Nos nove anos em que morei na capital brasileira, só em uma oportunidade foi numa casa, num condomínio, bem longe, a caminho de Unaí. 


No Chile, minha experiência ate o momento foi parecida com a de Brasília. Moro em apartamento desde que cheguei aqui em 2012. Primeiro, num apartamento pequeno de dois quartos, num edifício localizado no Centro de Santiago.


Gostava de morar lá, apesar de ser pequeno, mas com o tempo, começaram a construir muitos edifícios na nossa volta. O bairro começou a ficar cada vez mais cheio de novos moradores. 


Depois de 6 anos morando no mesmo apartamento, finalmente, mudamos para outro no mesmo edifício. Desta vez, um apartamento mais amplo, com três dormitórios e uma varanda mais espaçosa.


A gente sofreu bastante no verão porque ficava de frente para a piscina, em compensação no inverno, era uma tranquilidade. Tudo começou a mudar com os protestos de outubro em 2019. O bairro todo foi afetado na realidade.


Era muito perto do local onde aconteciam as manifestações, então, no dia seguinte sempre tinha algum resquício. Caminhar de manhã cedo até a escolinha da Gabi era tenso. Aliás, caminhando era o único jeito de chegar porque a gente não conseguia mais um taxi de manhã.


Aquilo foi me incomodando aos poucos. O Cristian também reclamava, mas era da presença de imigrantes que, segundo ele, faziam muito barulho. Além disso, também dizia que a presença deles trazia mais comércio informal para as ruas e por causa das manifestações não havia fiscalização.


O bairro era uma desordem, barulhento e perigoso. Aguentamos durante a pandemia porque eu e Gabi não tínhamos que sair. Mas assim que escolhemos o colégio onde ela iria estudar depois de concluída a escolinha, começamos a procurar apartamento perto do colégio. 


Durante a pandemia, eu procurava nos sites que anunciam aluguel e venda de imóveis aqui em Santiago. Quando encontrávamos algo interessante, o Cristián ia visitar. Até que, no dia da matrícula da Gabi no novo colégio, marquei uma visita num apartamento.


Era perto do colégio e fomos caminhando. Já não estávamos mais em quarentena total. Chegamos no edifício e amamos tudo! O melhor foi que era diretamente com a dona do imóvel. Como já tínhamos perdido outros apartamentos, decidimos não arriscar com esse.


Mandamos os papeis necessários e conseguimos! Adoramos a mudança! Apesar de toda a conjuntura de pandemia, conseguimos mudar em um fim de semana. Era Halloween. A Gabi não pôde sair para pedir doces, mas nós compramos alguns e ela vestiu a fantasia.


Entre caixas empilhadas e uma enorme desordem, ela passou com a sacolinha recolhendo os doces. A pior parte foi organizar tudo. Eu doei muitas coisas: moveis, roupas, brinquedos, eletrodomésticos. Uma amiga conseguiu uma empresa familiar que oferecia um serviço de reciclagem grátis.


Basta você ligar e eles passam na sua casa para levar as coisas. Mesmo assim, a gente tinha muita coisa. O apartamento anterior era maior e esse, apesar de ter um depósito no subsolo, e de ser relativamente espaçoso com armários bem amplos, é menor. 


O bairro é uma delícia, cheio de parques e praças por perto, com muito verde. Nossa rua é super tranquila e agora, com a quarentena, não se escuta absolutamente nada à noite durante o toque de recolher.


Sinto falta de sair na rua, caminhar em qualquer horário, sem precisar de autorização... Até com a máscara já me acostumei, mas ficar trancada em casa, me estressa. Afinal de contas, quando mudamos, não foi apenas para um apartamento gostoso, mas para um bairro maravilhoso que não estamos tendo a oportunidade de curtir pela contingência atual.


É bem frustrante... Nem sei como será no dia em que a Gabi voltar a ter aulas presenciais. Não tenho ideia de como será a nossa logística porque, apesar de ter alugado esse apartamento pensando nela e no novo colégio, as aulas por enquanto são apenas online.


Gosto de fazer sempre do limão uma limonada. Por isso, não posso reclamar. Ter mudado durante uma pandemia para um bairro melhor, um apartamento que eu gosto, com a minha família, não dá para reclamar.


Ter a felicidade de mudar a paisagem "da janela lateral do quarto de dormir" (literalmente) durante uma pandemia, quando tanta gente está sendo privada de preciosos minutos ao ar livre, curtindo a liberdade... no final das contas, sou afortunada, com certeza. 

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