Mãe, imigrante e amiga trabalhadora


Fim de semana passado escrevi sobre os eventos do fim de semana e um deles foi bem especial: um churrasco com um grupo de brasileiros que moram no Chile. Já participei de vários grupos desse tipo, mas nenhum é tão animado e alto astral como esse.



Tive muitas experiências com brasileiros aqui no Chile e algumas delas foram bem desagradáveis, diria até traumáticas. Sabe por que isso acontece? Porque muitas dessas pessoas assimilam o que existe de pior na sociedade chilena que é o “arribismo”. Antes que você fique em dúvida e se pergunte: o que é isso? Eu explico.

O arribista no Chile nada mais é do que conhecemos como emergentes no Brasil, ou seja, pessoas de classe média que, às vezes, têm uma situação econômica um pouquinho melhor e já se acham novos ricos. É aquela pessoa ambiciosa que valoriza bens materiais, status, alguém que aparenta ter uma situação sócio econômica que, muitas vezes, não condiz com a sua realidade.

Essas pessoas geralmente julgam os demais por coisas como: as roupas que usam, o carro que elas têm (ou não), a profissão delas, o bairro onde vivem ou o colégio onde os filhos estudam. Particularmente, não gosto de pessoas assim porque não está entre os meus valores esse tipo de mentalidade.

Venho de uma família simples, tenho uma vida sem luxos, muito classe média e tenho noção da minha condição e, honestamente, me sinto muito feliz. Porque tenho liberdade para fazer minhas escolhas, além disso, à noite durmo bem já que nunca precisei de muito para ser feliz.

Por isso, esse grupo que participo me fascina tanto: pela diversidade de histórias e a simplicidade das pessoas. É tão bom viver com pessoas que vivem no mundo real como nós, que usam transporte coletivo, fazem as próprias compras, quebram a cabeça para organizar as contas e ainda encontram tempo para um churrasquinho e a cervejinha.

Porque imigrar é algo cheio de perrengues, muito longe dessa fantasia de que sua vida muda totalmente para melhor. Muda sim. Tem coisas boas e ruins, como em qualquer situação. Desse grupo do churrasco, destaco duas histórias que são muito diferentes da minha e, ao mesmo tempo, tão iguais no sentir como imigrante.

Duas mulheres maravilhosas de distintas regiões do Brasil. Vamos chamá-las de Marias. A Maria do Nordeste é formada em Fisioterapia. Conheceu o marido chileno no Brasil, casaram-se, tiveram duas filhas e, depois de passar alguns perrengues vivendo com os pais dela, decidiram morar no Chile. Maria não tem tempo para nada e o dinheiro é curto, portanto, até hoje não conseguiu validar seus estudos. Ela trabalha vendendo doces e salgados brasileiros para os compatriotas que sentem saudades da nossa gastronomia. A família dela mora na mesma comuna do hospital onde o marido de Maria trabalha como auxiliar de serviços gerais.

Já a Maria do Sudeste é uma trabalhadora da zona rural do interior de São Paulo, onde cortava cana. Foi nesse ofício que ela conheceu o marido haitiano. Ele ouviu falar que o Chile era um país com boas oportunidades e juntos decidiram migrar para cá. Trouxeram a filha mais velha (que nasceu quando Maria era muito jovem) e juntos tiveram outra menina que nasceu em Santiago. Maria faz limpeza num hospital, trabalha dois dias e folga dois. O marido se vira como motorista de aplicativo e eles moram na periferia de Santiago.

Assim como essas Marias, conheci outras com uma situação similar, mas com um desfecho diferente ao chegar aqui porque os maridos tinham uma situação financeira melhor e, consequentemente, elas tiveram uma vida financeiramente mais tranquila. Mulheres que puderam optar por ficar em casa e não sair para trabalhar fora, assumiram o trabalho doméstico não remunerado e se dedicam a outras atividades no tempo livre.

Pessoalmente, me identifico mais com as Marias que trabalham fora e tenho mais assunto para conversar com elas. Mesmo que a gente venha de lugares diferentes, com situações sócio econômicas e histórias de vidas distintas, encontro mais pontos de conexão com elas.

E olha que eu já participei de grupos de mães aqui no Chile e fui a muitos encontros, conheci diversas mães e, sinceramente, dali nenhuma amizade vingou. Ser mãe é muito legal, mas não necessariamente te conecta com outra mulher. É preciso muito mais que isso para que a gente consigo conversar e também se interesse pela história de vida de outra pessoa. Quando a gente é mãe, mulher, imigrante e trabalhadora, a conexão é ainda maior porque compartilhamos vários sentimentos que nos acompanham todos os dias nessa caminhada fora do nosso país de origem.

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