Quarentena no Chile, dia 16

Vocês já pararam para pensar na passagem do tempo durante essa pandemia? Quer dizer, quanto tempo vocês estão perdendo, adiando planos, ficando em casa, vendo a vida passar? Minha mãe comentou sobre isso outro dia. Ela já tem mais de 70 anos e achou injusto quando minha sobrinha de 20 reclamou do tempo que estava perdendo. “Imagina eu”, indagou ela. 

Foto: Simon Rae (via Unsplash)

É verdade... uma pessoa jovem pode recuperar os dias em casa, mas quem já viveu uma boa etapa da vida nunca sabe quanto tempo ainda tem por aqui. Ontem mesmo me peguei pensando nisso... 


Comecei a fazer umas contas mentais. Meu pai faleceu jovem de câncer, não foi de causas naturais. Ele teve uma doença grave e morreu muito jovem. Minha avó materna também faleceu jovem. Ela teve um AVC.


Se, por motivo de força maior, esse fosse meu destino também – falecer relativamente jovem – teria mais uns 15 anos por aqui. Como a paranoia nunca vem sozinha, meu pensamento não se conteve e a viagem seguiu. 


Comecei a pensar quantos anos mais eu teria para conviver com a Gabi, quantos anos ela teria então. Em que etapa da vida estaria. E aí levei um susto porque ela teria 21 anos. Quando comecei a comparar com a minha história de vida, percebi que eu tinha 27 quando meu pai faleceu.


Era bem novinha também... Nunca tinha pensado nisso direito. A gente conviveu pouco e isso dói. É triste pensar assim. São coisas que a gente evita pensar para superar a perda e viver o luto.


Talvez por isso mesmo seja tão difícil até hoje pensar no meu pai e na morte dele. Porque eu era realmente muito nova. Não é o peso da idade o que incomoda, no fundo. É aquilo que não foi vivido.


Por isso, entendo o lamento da minha mãe. Não que não seja justo alguém jovem frustrar-se porque a pandemia realmente adiou todo os nossos planos. Mas a conta que eu fiz ontem me fez refletir melhor.


Como naquela música da Legião Urbana, “nessa saudade que eu sinto, de tudo o que eu ainda não vi”. Vale pra todos nós. Todo mundo tem planos, sonhos, metas e pensar que talvez a gente não tenha o tempo suficiente para realizar tudo isso, com certeza, traz sofrimento.

 

Por isso, uma coisa bem legal é viver o hoje. Passei por uma separação em 2007 que abalou minhas estruturas. Porque foi algo muito inesperado e demorei para assimilar o golpe e me levantar de novo.


Consegui. Um amigo depois me perguntou um dia: viu como ninguém morre por causa de uma desilusão amorosa? É verdade. Demora, mas a gente supera. Talvez a gente precise ver a pandemia e as quarentenas dessa forma. Como uma grande decepção amorosa.


É como quando a gente fica com o coração partido, chorando por dias, sem comer e dormir direito, pensando: por quê? O que eu fiz de errado? Ninguém fez nada de errado. Simplesmente aconteceu algo inesperado e agora todos temos que nos adaptar a isso.


Talvez não seja a melhor coisa do mundo ficar pensando nos planos adiados... Costumo dizer que hoje, mais do que nunca, devemos curtir as pequenas alegrias. Um dia bem vivido, o sol na varanda, um café quente, um vinho olhando a lua, uma cerveja gelada no calor, um bolinho caseiro, um abraço em quem mora com a gente, apertar nosso bichinho de estimação, aquela música que a gente adora, um filme inesquecível que dá vontade de assistir milhares de vezes, aquele livro que te deixa pensando... enfim, o que te dá prazer e alegria. 


Sinta, viva, curta, aproveite. Mesmo que seja uma alegria efêmera, essa é a energia que você precisa para viver mais um dia sem pensar muito sobre nosso futuro. 

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