Histórias de trabalho: a número 1!

Em 2023, completo 30 anos como integrante da população economicamente ativa. Comecei a trabalhar aos 16 anos de idade. Durante esse período, tive uma que outra pausa, mas nunca mais parei de trabalhar na minha vida. Gosto de trabalhar, sou daquelas pessoas que se dedica ao que faz, seja a tarefa mais simples, até a mais complexa. Não importa o que for, certamente farei bem feito. Antes que eu fique bem velhinha, vou compartilhar aqui as melhores histórias de trabalho começando com a primeira experiência. 

Torta de Sorvete


A número 1: recepcionista


Meu primeiro trabalho foi, na realidade, um estágio quando eu ainda estava no Ensino Médio. Naquela época, a gente podia trabalhar e receber uma bolsa-auxílio. A contratação era feita pelo CIEE (Centro de Integração Empresa-Escola). Não sei como funciona hoje e se continua tudo exatamente igual, mas era assim: a gente ia até a sede da associação no centro de Porto Alegre. Um funcionário te apresentava as opções disponíveis. Se você tinha interesse, agendavam a entrevista e ia até o local.  


Lembro que eu queria muito trabalhar porque buscava ser independente financeiramente. Quer dizer: ter dinheiro para as minhas saídas e viagens sem ter que pedir para os meus pais. Eu estudava de manhã, então, a única possibilidade seria um estágio no turno da tarde. Consegui um que era das duas até as oito da noite, no bairro Moinhos de Vento. A vaga era para recepcionista numa clínica de estética.


Fiz a entrevista com a nutricionista, dona da clínica - junto com o marido, também médico. Lembro que conversei com a gerente também, mas não me perguntem os nomes... Uff! A clínica nem existe mais! Procurei no Google e não existe nada, nenhum registro da Clínica Estética Imagem. A única coisa que encontrei foi o endereço. Descobri que hoje, no local, funciona uma produtora de eventos.


O início


Depois da entrevista, fui contratada. O salário era compatível com a função a única coisa bem ruim mesmo é que era longe da minha casa. Meus pais moravam na Zona Sul de Porto Alegre e nossa casa era longe de tudo! Pegava dois ônibus para ir e dois para voltar. O pior de tudo é que uma das linhas passava dentro de uma das vilas mais perigosas da cidade, a Cruzeiro. Todos os dias de noite passava por ali, com medo de assalto, ou de uma batida policial violenta... 


Era puxado. Saía do colégio correndo, almoçava em casa e saía de novo para o trabalho. Às vezes, almoçava na casa do meu namorado que morava na metade do caminho e dali para o trabalho. Ou ia para a casa dele na volta do trabalho e depois ele me deixava em casa. O mais cansativo mesmo era o traslado todos os dias. Esse foi o principal fator que me levou a pedir demissão depois de um tempo...


O fim


Esse foi meu primeiro estágio, então, eu era muito novinha e até mesmo para estudar era difícil. Lembro que uma vez tinha prova de Física, que não era o meu forte. Saí do trabalho, desci na casa de uma colega que me ajudou a estudar. Depois, me deu uma raiva porque eu fui bem na prova e a professora insinuou que eu tinha colado... 


Eu era uma excelente funcionária, tão boa que quando pedi demissão, o dono da clínica pediu para conversar comigo. Ele fez uma proposta e tentou me convencer a continuar. Infelizmente, o valor que ele podia oferecer não era o que eu esperava para continuar fazendo aquele baita sacrifício. Mas saí de lá em bons termos e orgulhosa porque ele tentou me manter lá.


O trabalho não era nenhuma ciência, mas foi meu primeiro emprego, então, reconheço meus méritos. Basicamente, tinha que atender o telefone e as clientes que chegavam na clínica para o tratamento. Era dessas clínicas que usavam aparelhos para reduzir medidas e celulite. Quem ficava na recepção, tinha que usar um uniforme (saia e terninho na cor vinho).


E o meio


Lembro de uma vez em que tive que receber um pagamento. Já era tarde e eu estava sozinha na recepção. Na era pré-histórica, os pagamentos com cartão de crédito não eram eletrônicos, como hoje. Você precisava passar numa maquininha manual e o cliente assinava um papel com carbono e ficava com uma segunda via como recibo. Nunca tinha usado a tal máquina e já estava dizendo para a cliente que ela teria que pagar no dia seguinte.


De repente, toca o telefone. Era o dono da clínica. Ele tinha visto por vídeo e escutado a conversa (a clínica tinha câmeras e microfones instalados, esqueci de mencionar esse big brother laboral). Ele perguntou se eu sabia usar a máquina e respondi que não, então, ele disse: ok, eu vou te guiar pelo telefone. E assim foi como aprendi a receber pagamentos com cartão de crédito.


Máquina antiga para receber pagamentos


Essa cliente era uma socialite bem famosinha de Porto Alegre, uma das herdeiras do grupo de supermercados Zaffari. Para quem não conhece, é uma rede bem famosa na capital, tipo o grupo Pão de Açúcar do Rio Grande do Sul. 


Além dela, tinham varias outras colunáveis que frequentavam a clínica, como as mulheres do ator Hique Gomez. Sim, mulheres: a mãe, a esposa e a filha frequentavam juntas a clínica e vinham fazer seus tratamentos de beleza no mesmo horário. Ele até deu o ar da graça uma vez em que eu estava lá, lembro bem.


A cumplicidade entre as funcionárias era bem forte já que todas vivíamos a invasão de privacidade proporcionada pelas câmeras de vídeo e pelos microfones instalados. Quando a gente queria conversar com calma, tínhamos que sair de dentro da clínica. Nesses momentos, um dos nossos programas favoritos era sair para comprar a torta de sorvete que vendiam ali perto...


Das pessoas que conheci, lembro de algumas com muito carinho, mas os nomes... Uma delas era a minha gerente, um amor de pessoa e super profissional. Ela tinha um filho pequeno e era bem disponível para o trabalho, apesar disso. Lembro que comentavam que ela era separada e que tinha sido casada com um grande executivo de um grupo importante do ramo de finanças.


Na recepção, trabalhei com duas pessoas que marcaram bastante essa experiência. A Gislaine era estilista e desenhava o figurino de uma escola de samba de Porto Alegre. Lembro que ela morava num edifício na avenida Ipiranga e meu ônibus passava bem na frente. Também lembro que ela estava num processo para mudar o nome porque ela não gostava. Foi a primeira vez que vi um caso assim e fiquei bem impressionada com aquilo.


Outra recepcionista que trabalhou comigo foi a Nilse, ela já tinha trabalhado há muitos anos na clínica e a chamaram de volta porque demitiram a Gislaine. Era uma senhora muito simpática, que gostava de escutar a rádio Continental, onde tocava Ray Coniff e também lembro que ela amava a música “Mel” da Bethânia.


Lembrar de tudo isso pode parecer pouco, mas conforme vocês forem conhecendo a quantidade de trabalhos que eu tive e as pessoas que conheci, vão perceber que é muito. Recordar essa experiência é uma maneira de reviver minhas memórias e preservar um pouco da minha história. Já que muitos desses registros, provavelmente nem existem mais, principalmente nesse caso, em que a clínica, efetivamente, deixou de funcionar.


Não foi a experiência mais emocionante, mas foi importante pelas pessoas que conheci e também por conta desse detalhe das câmeras e microfones nas áreas onde as funcionárias estavam. Ali, aprendi de cara, que a relação entre empresários e empregados pode ser, algumas vezes, extremamente difícil. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Sobre o 20 de setembro no Rio Grande

Feriados e datas importantes no Chile: confira o calendário e programe-se!

20 anos sem meu pai